Resenha: As cabeças das pessoas negras

A versão em e-book de As cabeças das pessoas negras pode ser lido no Skeelo Foto: Andreia Santana/@blogmardehistorias

As cabeças das pessoas negras reúne os contos de estreia da escritora Nafissa Thompson-Spires e deveria ser roteirizado em uma série semelhante a Dear White People (Cara Gente Branca) ou em um filme de Spike Lee. O livro venceu os prêmios PEN Open Book Award e Whiting Award. No Brasil, a edição da Companhia Editora Nacional traz prefácio da advogada, pesquisadora e ativista antirracismo Winnie Bueno. O texto do prefácio é uma sacudida necessária antes do leitor encarar as verdades da autora.

Nafissa Thompson-Spires parte de uma premissa que não é nova, vem desde Frantz Fanon com Pele Negra, Máscaras Brancas, mas que nos últimos anos tomou o centro do debate: o quanto o racismo adoece física e mentalmente as pessoas negras.

Os contos da autora exploram os pontos de tensão vividas pela comunidade afro-americana em Nova York e adjacências. Os personagens são muito reais e, guardadas as devidas proporções, dá para identificar nas falas e atitudes deles muitas semelhanças com integrantes de famílias negras [pretas e pardas] brasileiras.

A tensão aumenta um pouco mais nas histórias que têm como pano de fundo o colorismo, as relações inter-raciais e as famílias mestiças. A ironia dá o tom da maioria dos contos, que expõem ainda a violência policial e o racismo aberto ou mal disfarçado dos estadunidenses brancos.

Não ficam de fora, ainda, as fraturas provocadas pelo constrangimento mútuo e agressividade velada entre os negros ricos ou de classe média e aqueles mais pobres, em uma cultura consumista e focada no sucesso, como é a dos Estados Unidos.

O conto sobre a rivalidade de duas mães ricas e profissionais liberais competindo pelos desempenhos de suas filhas em uma escola de elite onde elas eram as únicas estudantes pretas, através de cartas e e-mails que começam protocolares e terminam em baixaria, é desconcertante, pungente, arrasador, pois reflete também sobre o quanto o racismo aumenta ainda mais os desafios da maternidade.

Como pontua Winnie Bueno no prefácio e o leitor percebe ao longo das histórias e da miríade de personagens do livro, As cabeças das pessoas negras cumpre uma função didática, a de mostrar para quem não entendeu ainda, que a negritude não é uniforme e que não é só o tom de pele das pessoas que varia, mas suas experiências, vivências e, principalmente, o quanto elas conseguem ressignificar-se diariamente, apesar das restrições e das neuroses legadas pelo racismo…

Ficha Técnica:
As cabeças das pessoas negras
Autora: Nafissa Thompson-Spires
Tradutora: Carolina Candido
Prefácio: Winnie Bueno
Editora: Companhia Editora Nacional, 2021
200 páginas
R$ 40,74 (físico, Amazon), R$ 34,90 (e-book, Kindle) ou para assinantes do Skeelo

************

*Lido para o desafio #50livrosate50anos, brincadeira que criei para comemorar meu aniversário. Em abril de 2024 eu faço 50 anos. A ideia é ler 50 livros até 30/04 e, se possível, resenhar ou fazer um breve comentário aqui no blog e no Instagram, sobre cada um deles. As cabeças das pessoas negras é o livro 35 do desafio. No total, até agora, 40 foram lidos, tem 10 na fila de leitura e cinco lidos aguardam postagem.

Deixe um comentário