Dica de série que descobri recentemente…
Lúcifer, série da Fox cuja terceira temporada, que estreou no começo de outubro, está atualmente em exibição, pode causar estranheza para quem só conhece o diabo em sua versão bíblica. Mas, para quem gosta de mitologia e histórias policiais, é um bom programa.
O personagem título foi criado por Neil Gaiman para uma das histórias de Sandman. Depois, ele ganhou uma graphic novel própria, o spin-off Lúcifer, escrito por Mike Carey para o selo Vertigo, da DC Comics.
A série se inspira livremente no Lúcifer Morningstar criado por Gaiman e nas aventuras vividas pelo personagem na graphic novel de Carey, com as devidas licenças poéticas dos roteiristas.
A estreia da primeira temporada aconteceu em janeiro de 2016 e, devido ao bom retorno de público, uma segunda temporada foi ao ar em setembro do mesmo ano. Com a segunda em exibição, a Fox confirmou uma terceira, com 22 episódios. Sete foram exibidos até agora.
Para quem quer começar a ver, a Netflix tem a primeira temporada completa. O canal Universal também comprou os direitos de exibição desde agosto deste ano e está reprisando as duas primeiras temporadas. Já na Fox, um episódio inédito da nova etapa é exibido toda segunda-feira.
Sobre o que é?
A história é ambientada em Los Angeles, cidade onde Lúcifer, vivido pelo ator britânico Tom Ellis, decide morar após se aposentar do comando do inferno. Em L.A, ele abre uma boate, onde além de gerenciar o negócio, também toca piano e canta. Tem números musicais em alguns episódios que são bacanas, dentro do contexto de cada história. Ellis tem boa voz e interpretação bem performática.
Ao sair do inferno, Lúcifer levou a demônio Mazeekin (Maze), que é fera em artes marciais e encarna uma femme fatale armada e perigosa. A atriz Lesley-Ann Brandt está à vontade no papel. As tiradas de Maze fazem dela um dos personagens mais divertidos da série.
Veja o trailer da primeira temporada
Na ‘cidade dos anjos’ ele conhece Chloe Decker (Lauren German), uma ex-atriz juvenil de comédias picantes que virou detetive de homicídios, e o ex-marido dela, Dan Spinozza (Kevin Alejandro), um policial que é o estereótipo do galã bonzinho e atrapalhado, como aqueles das comédias de Hollywood de antigamente. Fofinho e ingênuo, Dan faz um contraponto hilário com o exuberante Lúcifer.
O senhor do inferno passa a colaborar com a detetive na solução dos crimes mais estranhos, como ‘consultor’ da polícia de Los Angeles. E também vira uma espécie de ‘diabo da guarda’ de Chloe, que exerce uma estranha influência sobre ele e é imune aos seus poderes.
Além dela, de Maze e de Dan Spinozza, orbitam ao redor do diabo a psiquiatra Linda (Rachel Harris) – as sessões de Lúcifer no divã são um espetáculo a parte da série -, e o anjo Amenadiel (D. B. Woodwise), irmão mais velho do protagonista.
Esqueça os tabus do cristianismo

Lúcifer Morningstar (Estrela da Manhã), personagem criado por Neil Gaiman para uma das histórias de Sandman e protagonista de um spin off da DC Comics
A ideia da série Lúcifer não é seguir a bíblia à risca. A história bebe mais na fonte das mitologias antigas do que no sermão de domingo. Não dá para assistir pensando em obter ensinamentos religiosos e muito menos ficar comparando se as situações são coerentes com o livro sagrado dos cristãos. Tem de abrir a cabeça para embarcar em uma experiência mais cultural do que mística.
Lúcifer é mostrado como uma versão alternativa de Hades, o deus grego do mundo inferior, responsável por punir os maus. Ele tem a esperteza de Loki, o deus nórdico que é expulso de Asgaard, assim como o anjo ‘portador da luz’ foi expulso do paraíso.
A série, com sua mistura de mitos antigos, cultura pop, versões alternativas para a gênese e o apocalipse – e de forma irônica e até meio sarcástica -, questiona o fanatismo religioso, o culto às celebridades e as muitas idiossincrasias da humanidade. Lembra o fantástico Belas Maldições, livro que Neil Gaiman escreveu em parceria com Terry Pratchett.
A intenção não é catequizar e nem ser levada a sério. Embora tenha alguns momentos dramáticos, é mais um programa de aventura, com toques de comédia, para entreter e, no meio da diversão, dar uma chacoalhada nos preconceitos e tabus religiosos, principalmente nas ambiguidades da fé.
Os personagens principais têm várias camadas e são cativantes. Os coadjuvantes não ficam atrás e dão um equilíbrio justo ao elenco. No decorrer das temporadas, todos eles evoluem de uma forma bastante interessante.
Lúcifer, principalmente, com toda a amoralidade que caracteriza o diabo e os deuses antigos, senhores caprichosos do bem e do mal, acaba se revelando, em muitas situações, muito mais próximo dos humanos do que dos anjos ou demônios. Ele me lembra uma mistura de Gibreel Farishta com Saladim Chamcha, os dois personagens principais de Os versos satânicos, de Salman Rushdie.
Para quem não se deixa amedrontar pelas promessas de ‘fogo e enxofre’ dos sermões, vale entrar na brincadeira proposta pela série e fazer o exercício de enxergar o inferno, ou o mundo inferior dos gregos, com outros olhos…
Gostei muito deste site e sua abordagem e comentários sobre a série Lúcifer, da qual sou particularmente muito fã. Obrigada!.
Oi, muito obrigada pela visita e pelo comentário. Também gosto muito da série!