Resenha: Série Como treinar o seu dragão

Como navegar com os vikings sem perder a cabeça na lâmina da espada

Andreia Santana

Unir mitologia e histórias com roupagem mais moderna não é uma novidade na literatura. Tampouco é a reinvenção da roda, desde a popularização do gênero por J. K. Rowling, criar séries inteiras que mostram a iniciação de jovens aparentemente comuns rumo ao heroísmo. Essa tradição, no entanto, não foi inventada pela criadora de Harry Potter, e também está na mitologia clássica, basta lembrar as tarefas de Perseu ou mesmo Hércules, jovens que, antes de descobrirem seus talentos semidivinos, foram criados como mortais comuns.

Mas o que Cressida Cowell faz com a saga Como treinar o seu dragão é ir além das tradições descritas acima. Como representante de seu tempo, ela lança mão do truque de unir a mitologia nórdica e a história dos vikings com a narrativa ágil, divertida e clara que agrada a geração atual. Também utiliza o recurso da iniciação do jovem guerreiro para criar uma novelinha sobre amadurecimento, generosidade e amizade, mas com pitadas de humor ácido e piadas inteligentes que dão o diferencial da série, destacando-a entre a multidão de títulos que chegam às livrarias.

As ilustrações da resenha são da animação Como treinar o seu dragão, da Dreamworks

Os primeiros livros da série Como treinar o seu dragão serviram de base para o roteiro de uma animação infanto-juvenil belíssima, dirigida por Peter Hastings, que agrada também ao público mais velho. Embora o filme tenha ajudado na popularização dos livros no Brasil, vale ressaltar que comete inúmeras licenças poéticas, para adaptar a história ao gosto do público de cinema; e que as obras escritas possuem muito mais surpresas divertidas para quem se aventurar pelas ilhotas do Mar Interior junto com o jovem viking Soluço Spantosicus Strondus III.

Cressida Cowell brinca com os estereótipos e com a tradição histórica que descreve os vikings como guerreiros impiedosos, verdadeiros brucutus dos mares, piratas sanguinários e desgrenhados, com suas cabeleiras ruivas ou loiras, pavio curto e uma intrincada mitologia formada por deuses igualmente cruéis e impacientes. Mas ela usa muito carisma para descrevê-los, e a linguagem atual e fresca de seus livros aproxima esses personagens quase remotos da cultura atual, tornando-os adoráveis em sua brutalidade.

A série conta a história do jovem Soluço, filho único do chefe dos Hooligans Cabeludos, vikings que vivem na inóspita ilha de Berk e possuem dragões como uma espécie de bicho de estimação e ajudantes para as tarefas mais árduas. O primeiro livro mostra como os aspirantes a guerreiros da tribo, entre eles Soluço, um garoto que pela descrição física e pelo temperamento cordato é o menos provável candidato ao Valhala (o paraíso na cultura viking era reservado só aos heróis), devem capturar e treinar o seu próprio dragão.

Cabe a Soluço um pequeno e teimoso dragão chamado Banguela, e juntos eles se metem em inúmeras confusões, sempre com o jovem aprendendo mais sobre si mesmo e descobrindo capacidades e talentos que ele nem imaginava que possuía. Soluço destoa do mundo ao seu redor. Enquanto seus pares são grosseirões e resolvem tudo na base da força, ele é astuto e observador, compensando a pouca força física com sagacidade.

No segundo livro, Soluço tem aulas de pirataria e está às voltas com a caça ao tesouro de seu bisavô Barbadura. As descrições das disciplinas ensinadas aos jovens guerreiros, a exemplo de Descortesia Avançada, além dos nomes esdrúxulos dos personagens, são uma diversão à parte.

No terceiro volume, ele acaba metido numa grande encrenca com o Império Romano e um inescrupuloso cônsul obeso, que adora comer dragões lambuzados de mel, para desespero das espécies menorzinhas. No quarto livro, Cressida brinca com a teoria que diz que na antiguidade, muito antes das viagens de descobrimento, os vikings teriam chegado à América e coloca Soluço em uma luta mortal com a tribo rival dos Histéricos pela posse de um vegetal que seria a cura para a mordida assassina da Vorpente Venenosa, um dragão que o que tem de minúsculo, tem de letal.

A série, lançada no Brasil pela Intrínseca, possui até o momento oito títulos e em cada um deles, um desafio novo é imposto a Soluço, que é o narrador da história. Cressida se transforma em um Soluço idoso, saudoso das grandes aventuras que viveu na infância e juventude e, utilizando-se dessa sabedoria acumulada na maturidade, pontua a narrativa de reflexões profundas e ao mesmo tempo capazes de despertar a atenção e ficar registradas na memória até do leitor menos afeito a extrair “morais da história” daquilo que lê.

Como treinar o seu dragão, tanto na forma quanto na capacidade de não subestimar os jovens leitores, lembra as histórias deliciosas de Roald Dahl, um autor que sempre soube misturar na medida certa o lirismo e o humor. No fim das contas, os vikings de Cressida Cowell não reinventam a roda, mas fazem a diferença navegando em águas conhecidas.

Fichas Técnicas:

Como treinar o seu dragão

Autora: Cressida Cowell

Tradução: Heloísa Prieto

Editora: Intrínseca

224 páginas

R$ 19,00 (em média)

Como ser um pirata

Autora: Cressida Cowell

Tradução: Heloísa Prieto

Editora: Intrínseca

224 páginas

R$ 19,00 (em média)

Como falar dragonês

Autora: Cressida Cowell

Tradução: Heloísa Prieto

Editora: Intrínseca

240 páginas

R$ 19,90 (em média)

Como quebrar a maldição de um dragão

Autora: Cressida Cowell

Tradução: Heloísa Prieto

Editora: Intrínseca

240 páginas

R$ 19,90 (em média)

>>Visite o site oficial da série para saber mais

>>Leia um trechinho de Como ser um pirata aqui

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