Filme de férias 2012: Tão forte e tão perto

Thomas Horn está bastante à vontade e convincente no papel de Oscar, sem caricaturas

Aprecio os dramas de Stephen Daldry. O primeiro que vi foi o aclamado As horas, quando estreou no cinema. Depois, em um dos corujões da madrugada, minha mãe e eu, insones, assistimos o belíssimo Billy Elliot, que de todos do diretor é o meu preferido. Depois veio O leitor, interessante e comovente, mas dos três já citados é o mais fraco, na minha opinião. E neste fim de semana, o último das férias, vi Tão forte e tão perto, que conseguiu resgatar a qualidade narrativa e a sensibilidade de Billy Elliot.

Daldry tem preferência pelos dramas tipicamente humanos, de fundo psicológico, com nuances sutis, que comovem sem descambar para o sentimentalismo barato. E neste último filme ele trata de um tema espinhoso: o pano de fundo para a história de um menino com um quase diagnóstico de Síndrome de Aspergen que fica órfão de pai é o fatídico 11 de setembro de 2001.

Tom Hanks dá um tom moderado ao pai dedicado

O filme conta a história de Oscar e da relação de cumplicidade e grande carinho que ele mantinha com o pai, uma das vítimas do desabamento das Torres Gêmeas. Após a morte do pai, Oscar inicia uma busca para localizar a fechadura onde se encaixa uma misteriosa chave encontrada no armário do morto. Sabendo dos medos e limitações do filho, o pai tratava-o de igual para igual, estimulando sua inteligência e canalizando as obsessões por planejamento e organização do menino, para expedições criativas e científicas pela cidade  de Nova Iorque. Seguindo o mesmo método das “aventuras” com o pai, Oscar quer descobrir se a misteriosa chave abre um cofre com um segredo ou última mensagem de seu pai, ou mesmo alguma porta secreta. Mais que isso, ele quer manter o contato com o pai morto (com o sentimento que os unia), mesmo tendo consciência da separação definitiva.

Tão forte e tão perto me agradou tanto por ser um filme muito bem resolvido. A história dura o tempo certo, sem se arrastar e sem cansar o espectador. Algumas cenas são de fazer chorar, mas o filme todo provoca uma emoção genuína, de identificação imediata com os sentimentos humanos como o de perda, o medo da morte, a busca por autonomia, a necessidade de compreensão, a superação da dor. O ator protagonista, Thomas Horn, que vive Oscar, dá ao personagem bastante profundidade, sem caricaturas. O elenco adulto da trama, Tom Hanks, Sandra Bullock e Viola Davis, entre outros, mantém suas interpretações na medida certa, com as deixas adequadas para que Horn conduza a história sob o ponto de vista de Oscar, que é também o seu narrador.

O veterano e sempre bom de ver Max von Sydow é o misterioso “Inquilino”, que tem ligações profundas e antigas com a família de Oscar

De uma delicadeza e dramaticidade enormes são as cenas do menino com Max von Sydow, que vive o misterioso “Inquilino”, um homem que está hospedado em um quarto na casa da avó de Oscar. O sueco e distinto Max von Sydow, veterano de outros bons dramas, vive um homem que não fala e só se comunica através de bilhetes. Ele ajuda Oscar na busca pelo “segredo” da chave e aos poucos, revela quem é e que tipo de relação mantém com a família do garoto.

O laço mãe-filho também não é esquecido. A mãe de Oscar, que substimava a própria capacidade de comunicar-se e entender o mundo particular do filho, após a perda do marido, busca aprofundar a relação dos dois. Mais do que meramente preencher a ausência do pai, ela quer marcar um lugar próprio, consciente de que o espaço da memória e da saudade não podem ser substituídos, mas uma nova relação de cumplicidade pode atenuar a dor da perda e é também necessária para possibilitar que Oscar continue progredindo e conquiste autonomia numa sociedade como a norte-americana, que costuma não ser condescendente com as limitações. No entanto, mais do que um filho “normal”, essa mãe quer compreender o mundo através dos olhos de Oscar.

Tão forte e tão perto é um filme sobre o luto particular de um menino, usado como metáfora para o luto particular dos familiares que perderam parentes no desabamento do World Trade Center, mas com o foco nos dramas domésticos, não no luto de uma nação ou na justificativa desse luto para realização de “exorcismos” ou “caça às bruxas”. Mais do que ferir o orgulho da nação mais poderosa do mundo, a queda das Torres Gêmeas resultou em perdas particulares de pais, mães, maridos, esposas, filhos e etc. Este é um filme sobre a capacidade de seguir em frente passado o choque inicial da perda e a revolta pela ausência. É ainda sobre memória, mas não a memória amarga de uma nação traumatizada, mas a privada de familiares que sentem saudade. E, por fim, é sobre o aprendizado da dor, sua vivência e superação.

Dei nota 9,5 (quatro estrelas e meia do Filmow) e recomendo para quem não viu.

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