Mãe das águas

A mãe e o menino entraram no mesmo ônibus que tomo para o trabalho. Quinta-feira chuvosa e alagada em Salvador. Entraram pela porta da frente. Ele com a merendeira, um classificador de atividades e uma camisa de mangas compridas por dentro da fina camiseta da farda escolar. Ela com look funcional: jeans, camiseta, tênis e uma bolsa a tiracolo (uniforme básico de mães que saem com crianças pequenas). Havia ainda uma sombrinha colorida como aquelas de dançar frevo em Olinda. Acomodou o filho em um dos bancos e, após recomendar que ele se segurasse para não cair, avançou pelo corredor do coletivo até a cadeira do cobrador. Pagou a passagem e voltou para junto do filho. Quatro pontos depois, puxou a corda e pediu a parada. Colocou o classificador do menino embaixo de um braço,  a merendeira enfiada no mesmo ombro da bolsa e o segurou para que levantasse do banco. Pingos começavam a cair do lado de fora. “Guigo, cadê seu guarda-chuva?” Guigo olhou para a mãe como se tivesse acabado de aterrisar de Marte, franziu a testa e encolheu o nariz. Ficou muito lindinho! “Esqueceu na escola de novo?” Ele respondeu com uma vozinha que não traiu a tenra idade (no máximo, Guigo deve ter quatro anos): “Me esqueci sim, mamãe”. Desceram. E os pingos, mais e mais grossos. Ela abriu a sombrinha colorida e a colocou na mão direita de Guigo. Segurou a esquerda e assim, carregada com um classificador de atividades, uma merendeira, uma bolsa e uma criança, atravessou a rua com a cara na chuva…

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