A sessão sofá da vez foi o filme Inception e confesso que fiquei na bronca logo de saída por Leonardo DiCaprio ter emendado dois papeis muito parecidos: o detetive Teddy Daniels, de Ilha do Medo (adaptação muito boa de Martin Scorsese para o excelente romance de Dennis Lehan) e Dom Cobb, uma espécie de Morpheu às avessas, que invade os sonhos de outras pessoas para roubar informações e revendê-las. Os dois papeis representam homens atormentados, que utilizam-se de diversos recursos para fugir da realidade, perderam as esposas de forma trágica e, apesar do amor incondicional pelos filhos, não conseguem mantê-los a salvo dos delírios maternos. As semelhanças de um filme e outro não ficam por aí. Até o tema dos dois tem pontos em comum, um trata da construção de universos paralelos através da loucura e o outro, através do sonho, essa pequena morte que nos assalta todas as noites, levando-nos a viver outras vidas dentro de uma mesma vida. No entanto, quem procura questões filosóficas – ou psicológicas – profundas em Inception, traduzido de forma tosca para A origem, no Brasil, pode tirar o travesseiro do armário. O filme se utiliza sim de algumas teorias da neurociência que explicam os estágios do sono e do sonho, mas a pretensa naturalidade com que as informações são jogadas na tela só servem para confundir. Louvável a ideia do roteirista de não cansar o espectador com explicações didáticas sobre o ato de sonhar, mas daí a parecer natural ao cidadão comum (eu me incluo no pacote) que os atores passem metade do filme falando em inserções, “chutes” e camadas profundas do inconsciente, é um pouco demais. Além disso, o filme vira um thriller de ação alucinante, com sequências quase esquizofrênicas e um desfecho muito parecido com aquele de Ilha do Medo. Leo DiCaprio, que já provou ser bom ator em outros papeis, me pareceu desinteressado como Cobb e embora repita padrões de Teddy Daniels, esse último teve do ator uma atenção e um esforço de interpretação muito maiores. Scorsese com certeza tem a mão firme. Resumo da ópera: como entretenimento é cansativo e como filme para ser levado a sério, não é para ser levado à sério. E se alguém vier para o meu lado com o papinho edificante de que a grande mensagem é que não devemos confundir sonho e realidade, minha resposta será impublicável. Nota 6, porque nem os efeitos especiais, embora criem sequências interessantes, conseguiram aquela atmosfera onírica digna da terra do rei Morpheu.
Ficha do filme:
Inception, EUA/Reino Unido, 2010, Ação, Romance
Direção: Christopher Nolan
Elenco: Leonardo DiCaprio, Ellen Page, Ken Watanabe, Marion Cotillard, Michael Cane…
Sinopse: Dom Cobb (Leonardo DiCaprio) precisa cumprir um último trabalho invandindo sonhos antes de poder voltar para casa e para os filhos. Enquanto trabalha para um cliente poderoso, que quer destruir a empresa de um rival nos negócios implantando em seu herdeiro a ideia de desmembrar e vender o império, ele precisa controlar seu subconsciente, dominado pela lembrança da ex-mulher, Mal (Marion Cotillard). O descontrole de Cobb, um ex-notório “arquiteto de sonhos” que não pode mais construí-los devido à presença de Mal em sua mente, pode colocar toda a sua equipe de “sonhadores” no limbo para sempre…
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