O sociólogo polonês Zigmunt Bauman define a época em que vivemos como a fase líquida da modernidade. A fase sólida seria aquela em que estruturas como família, comunidade, governo e religião limitariam nossas escolhas individuais, “assegurando a repetição de rotinas e padrões de comportamento aceitáveis”. Na fase líquida, há uma reconfiguração de todas essas instituições, uma mudança de valores e parâmetros, consequentemente, de comportamentos, muito mais rápido do que os séculos necessários para o desenvolvimento da sociedade. Parece papo cabeça ou conversa de acadêmico, mas se formos destrinchar direitinho o que Bauman propõe, veremos que estamos de fato vivendo uma época bem mais veloz do que alguns de nós, sobretudo os mais velhos, são capazes de assimilar. Quem nasce nos tempos líquidos, já nasce nadando com desenvoltura, respirando como se ao invés de pulmões, tivesse guelras, plenamente adaptado, totalmente veloz. Quem nasceu no meio-termo, eu e uma boa parte das pessoas que conheço e provavelmente das que estão lendo este post, dão suas braçadas nesse mar de novidades, engolem um pouco de água, afundam e voltam à superfície para aprender e adaptar-se, um pouco mais a cada dia. Quem nasceu no tempo das nossas mães e antes delas, das nossas avós – com exceções, claro -, surpreendem-se com a perda de diversas referências que marcaram gerações. Se tudo isso é bom ou ruim, minha intenção e acredito que a de Bauman, não é julgar, mas refletir sobre a atualidade e sobre seus efeitos na nossa vida, nos laços afetivos, comunitários. É a velha questão que atormenta a humanidade desde Sócrates, a reflexão sobre o que somos, de onde viemos, para onde vamos, o que esperam de nós, o que espero dos outros, tudo isso traduzido na simples pergunta “Quem sou eu?”. Pois nos “tempos líquidos” somos membros de comunidades reais cada vez mais destituídas de substância (novos arranjos familiares, novas formas de viver a relação a dois, novas formas das pessoas e dos países se relacionarem, novas maneiras de experimentar a maternidade e a paternidade); e somos também membros de comunidades insubstanciais e etéreas, mas que independente de não serem palpáveis, fazem cada vez mais sentido para nós (este blog ou qualquer outro blog, os sítios da web, a realidade virtual, os universos paralelos do orkut, myspace, twitter e etc, que nos unem nos quatro cantos do planeta, sem que o contato físico, o diálogo cara a cara seja antes pré requisito para o conhecimento). “Vivemos em rede e não mais em sociedade”. Nossas regras agora são flexíveis e não mais tão rígidas quanto há 50 anos. Estamos conectados, ultra informados, abertos e expostos ao mundo. Mas ainda precisamos de laços sólidos, de portos seguros. Ainda precisamos de amor, de compreensão, que nos notem, que nos deem ouvidos, que nos abracem e incluam. Na nossa sociedade de aparências, de big brothers, de câmeras de vigilância no shopping center, de comodidades da vida contemporânea e ao alcance das mãos ao clique do mouse, ainda precisamos de proteção contra a única coisa da qual a modernidade, seja líquida, sólida ou gasosa, não consegue nos proteger: o destino.
DICA DE LEITURA:
Tempos Líquidos
Autor: Zigmunt Bauman
Editora: Zahar
Preço: R$ 27,00
Leia um trecho da obra.