Menina brinca de boneca e menino…

Vi um pai e um filho na fila do supermercado neste sábado. O menino devia ter uns sete anos. O pai tinha mais de 30, mas era novo, não tinha chegado aos 40, com certeza. Uma boneca bebê, dessas com o corpo de pano, pernas e braços de plástico, cabeça careca e um tufo de cabelo preso num laçarote, descansava dentro de um carrinho de compras abandonado, junto com diversos produtos descartados e esperando os funcionários recolherem para devolução às prateleiras. O menino pegou a boneca. Crianças de sete anos, independente do sexo e das predileções por este ou aquele tipo de brinquedo, vêem com os dedos, precisam tocar para entender. O pai deu um tapa na mão da criança e jogou a boneca de volta sobre o monte de pacotes e caixas do carrinho abandonado.

“É menina que brinca com boneca!”

Saí do supermercado pensando no tipo de criação que uma criança com um pai desses recebe e no que alguém criado por uma pessoa assim se transforma quando cresce. Certamente em outro pai igualzinho. De certa forma, aquele rapaz é fruto da criação que recebeu e repassa para o filho o que já fizeram com ele. Fiquei pensando na frase do homem no supermercado: “É menina que brinca com boneca!” Será que, nos dias de hoje, ainda se justifica tamanha divisão de papéis?

As bonecas e todo aquele jogo de panelas em miniatura surgiram como imitação, simulacro da realidade que preparava as meninas, desde novinhas, para a vida de esposas e mães.
masculino-e-feminino
E os pais que atualmente cuidam dos filhos sozinhos? Aqueles que trocam fraldas, fazem mamadeira, colocam o bebê no ombro para arrotar? Levam à escola, ensinam dever de casa… Existem pais assim e eles não são invenção moderna, embora atualmente a quantidade de homens que aderem a uma paternidade mais participativa esteja aumentando. As meninas, por sua vez, não são mais educadas para se tornarem esposas e mães, apenas. Ter ou não filhos, dividir as tarefas da casa, sair para trabalhar enquanto o marido cuida do jantar são realidades cada vez mais comuns na sociedade.

O arranjo familiar deixou de seguir o padrão pai, mãe e filhos e se configura em tantas combinações quantos são os laços que unem as pessoas. Crianças criadas com avós, ou que vivem apenas com um dos pais, ou que moram com tios, ou que são criadas por casais homossexuais. Não existe mais uma família padrão. Ainda bem, porque se o amor é tão diverso, porque só um modelo de família tem de ser aceito?

E a minha reflexão chegou exatamente neste ponto. Aceitação. Nossa sociedade está evoluindo há milênios, tanto em aspectos positivos quanto nos negativos, infelizmente, mas está evoluindo. A aceitação de que meninos podem brincar com bonecas e meninas podem fazer artes marciais ou colecionar carrinhos ainda não é total, mas estamos avançando. A atitude desse pai no supermercado, que me chocou pela rudeza, não é mais a regra e sim a exceção, resquícios de uma educação antiquada, intolerante e que tende a desaparecer, assim espero.

Precisava dividir essa inquietação com vocês, para que me ajudem a enxergar todos os lados da questão. Vamos debater?

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