XIII – O aprendiz da feiticeira (final)
O príncipe Rajá estava disposto a visitar o Grande Deserto de Sal e comunicou à feiticeira Ishstar a decisão de deixar a Floresta Sem fim. No início, ela disse ao menino que o seu treinamento não estava concluído e que, portanto, não lhe daria permissão para ir embora. Depois, lembrou que Rajá tinha chegado ao seu reino por conta própria, depois de se arriscar muitos dias na Floresta Sem Fim e que ela havia decidido treinar o jovem príncipe, impressionada com a coragem do menino. Rajá não havia pedido nada, portanto, era livre para ir e vir aonde bem entendesse, embora tivesse menos de 11 anos e fosse um fugitivo de casa.
O menino conhecia todas as bibliotecas da Cidade de Ouro e Prata e estava fascinado pela idéia de ser o primeiro habitante da mitológica cidade-palácio a conhecer todas as maravilhas descritas nos antigos pergaminhos e livros. Ishstar percebeu que de nada adiantaria tentar convencê-lo a desistir da viagem até o Deserto de Sal. Imaginava ainda que, uma vez chegando ao grande deserto, ele avançaria até as Montanhas do Nunca Mais e, uma vez que chegasse até a imensa cadeia de montanhas, se aventuraria pelo Bosque Engolido, navegaria pelo Mar das Lendas – talvez até encontrasse alguma baleia! – e só então, finalmente, voltaria para casa.
O correto seria mandar um emissário até a Cidade de Ouro e Prata, para avisar ao rei Paxá do paradeiro do jovem príncipe. Assim, o rei mandaria buscar o menino e ele ficaria seguro em casa. Mas, Ishstar sabia que se fizesse isso, Rajá tentaria escapar de novo do palácio e quem sabe que tipo de perigos ele enfrentaria? O melhor, pensava a feiticeira, é permitir que ele conheça todos os reinos que deseja conhecer e depois, volte para casa e compartilhe seus conhecimentos.
Sem argumentos para fazer Rajá desistir da viagem – a verdade é que a feiticeira gostava do menino e apreciava mais ainda o fato da sua casa estar brilhando de tão limpinha graças às tarefas domésticas feitas pelo príncipe – ela resolveu ajudá-lo com os preparativos.
Primeiro, arrumou uma sacola nova para ele transportar alimentos e outros objetos durante a viagem. Colocou na sacola uma manta bem quente para aquecê-lo durante a noite, e uma túnica nova, para o menino vestir antes de voltar para casa. A feiticeira não achava certo ele aparecer no seu palácio todo maltrapilho e esfarrapado, depois de ter visitado tantas terras novas. Colocou na sacola ainda: uma faca de caça, pedras mágicas que criavam fogo e dois vidrinhos com poções muito poderosas, uma capaz de transformar qualquer tipo de pedra em comida e outra para curar qualquer doença. Antes da viagem, Ishtar o fez vestir roupas novas, uma capa e, após negociar com todos os espíritos da floresta, devolveu ao menino todas as pedrinhas do turbante que ele havia trocado por comida e água enquanto tentava chegar à casa da feiticeira.
Rajá ficou comovido com a ajuda de Ishstar. Para retribuir, colheu as flores mais bonitas que tinha conseguido encontrar na floresta e com elas enfeitou a casa da feiticeira. Apesar das brigas durante o seu treinamento e dos exercícios árduos que Ishstar impunha, o menino gostava muito da feiticeira. O príncipe tinha ainda um último favor à pedir à sua nova amiga e ex-mestra. Ele gostaria que Ishstar cuidasse da cobra Hamida enquanto ele viajava. No retorno para a Cidade de Ouro e Prata, ele passaria na casa da feiticeira e pegaria sua mascote.
Hamida estava habituada ao conforto da casa de Ishstar e, além disso, Rajá poderia viajar mais rápido, sem levar o peso extra da jibóia à cintura. Ele explicou para a cobra que não a estava abandonando, mas ele precisava ser rápido para conhecer todos os reinos vizinhos e voltar ao palácio-cidade antes do seu aniversário de 11 anos. No dia do aniversário de Rajá, o rei Paxá iria apresentá-lo aos habitantes da Cidade de Ouro e Prata como o sucessor oficial ao trono.
Todo mundo na cidade-palácio conhecia o jovem príncipe, claro, mas esse ritual da apresentação já existia há muitos milênios, desde o primeiro rei da Cidade de Ouro e Prata, e Rajá não queria deixar seu pai sem cumprir um ritual que ele considerava tão importante. Além disso, a culpa por ter fugido de casa e hipnotizado os pais queimava no peito do menino. Com tantas novidades para descobrir, ele muitas vezes esquecia-se da sua travessura, mas quando estava sozinho ou quando sentia saudades de casa, o remorso o torturava. Quanto mais rápido ele descobrisse o mundo e voltasse para o seu reino, mais depressa também poderia reparar seu erro.
Continua no próximo post
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Leia os outros capítulos da história:
>>Capítulo I: A cidade de ouro e prata
>>Capítulo II: A vida doce dentro das muralhas
>>Capítulo III: Uma gaiola dourada e um passarinho triste
>>Capítulo IV: O sinistro mago Islamal
>>Capítulo V: O pedido de Rajá
>>Capítulo VI: O plano de Islamal
>>Capítulo VII: Aprendiz de hipnotizador
>>Entre capítulos: Carta de Rajá aos pais
>>Capítulo VIII: A Floresta Sem Fim
>>Capítulo IX: A língua universal
>>Capítulo X: A feiticeira da lua crescente
>>Capítulo XI: O rei destronado (parte 1)
>>Capítulo XI: O rei destronado (parte 2)
>>Capítulo XI: O rei destronado (final)
>>Capítulo XII: A rainha prisioneira
>>Capítulo XII: A rainha prisioneira (parte 2)
>>Capítulo XII: A rainha prisioneira (parte 3)
>>Capítulo XII: A rainha prisioneira (final)>
>Capítulo XIII: O aprendiz da feiticeira
>>Capítulo XIII: O aprendiz da feiticeira (parte 2)
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