Da série, Migrações
Em setembro passado substitui um colega, editor de fechamento. Na ocasião, escrevi o textinho abaixo sobre o quanto é sofrível trabalhar à noite. Em janeiro deste ano passei a trabalhar à noite em tempo integral, na edição de fechamento, e estou adorando a experiência. O post migrou porque o quesito bravos guerreiros e solidariedade entre os notívagos, continua valendo…
Afora lobos, vampiros, múmias e mulas-sem-cabeça, o universo noturno é povoado pelas mais estranhas criaturas que existem, também dadas às trocas de horário, inversões da lógica estabelecida pela natureza e substituição do dia pela noite. A diferença é que enquanto os seres míticos citados no início do post nasceram para vagar na escuridão, as demais criaturas noturnas o fazem de forma compulsória. Bombeiros, enfermeiros, policiais, médicos, atendentes de tele sexo e do sexo propriamente dito, ao vivo e sem tantas cores; e jornalistas, claro.
Enquanto a cidade dorme, ou tenta dormir, centenas de trabalhadores neste vasto país saem de casa quando deveriam estar voltando e encaram uma jornada exaustiva madrugada à dentro. Com bravura vencem todos os hormônios que atuam no cérebro avisando que a noite foi feita para o descanso e sem o menor pudor desafiam o Senhor dos Sonhos: “Vai encarar,Morpheu? Nem vem que não tem! Nesses olhinhos que um dia a terra vai comer você não joga suas areias do tempo”.
O mais engraçado de tudo isso é que as criaturas transformadas em notívagas pela força das circunstâncias (financeiras, obviamente) se solidarizam umas com as outras e é uma tal troca de lanchinhos da meia-noite, piadas e palavras de incentivo. – “Tou um caco, meu cérebro não processa mais”. – “Força irmão,você consegue, faltam duas horas para acabar o plantão!”.
A experiência de habitar entre os seres da escuridão é interessante, mas eu voto pela minha cama, de preferência naquele horário antes da carruagem virar abóbora.